A compilação mais conhecida é a de Albert Mackey (1807-1881), com 25 cláusulas pétreas ("conhecida" é o modo de dizer, pois a maioria dos maçons desconhece o conteúdo e significado dos Landmarks, apesar de jurarem sobre ele a vida toda).
E, para o espanto de muitos, a lista inventada por Albert Mackey é tão "pétrea" que foi contestada por muitos eminentes maçons da América e da Europa, recusada ferozmente pelo outro Albert ‒ o Pike, considerado o "Papa do Rito Escocês". Para Joseph Gottfried os Ladmarks são nove; dezessete para Robert Morris; quinze para a Grande Loja de Tennessee; doze para Mac Bride; dez para a Grande Loja de Nova Jersey; dezenove para Luke Lockwood; quinze para a Grande Loja de Connecticut; sete para Grande Loja de Massachussets; vinte e seis para a Grande Loja de Minnesota; cinquenta e quatro para a Grande Loja de Kentucky.
Durma-se com um barulho desses! Por aí vocês podem imaginar o quanto são "imexíveis" esses Landmarks... e como são "respeitados" na América as "Old Charges of Craft Freemasonry" (Antigas Obriga- ções do Ofício dos Pedreiros Livres) .(1) O assunto deixaria de ser polêmico se decidíssemos nos curvar à voz do "vaticano maçônico" ‒ a Grande Loja Unida da Inglaterra ‒ que, apesar de não usar a expressão Landmark, fixou basicamente oito condições sem as quais eles não reconhecem as demais maçonarias do mundo:
" 1º - Que cada Potência tenha sido estabelecida legalmente por um organismo maçônico devidamente constitu- ída ou por três ou mais Lojas regularmente constituídas.
2º - Que seja professada a crença num Ser Supremo, na Sua vontade revelada e consequente crença na imortalidade da alma.
3º - Que todos os Iniciados assumam sua obrigação sobre o volume aberto da Lei Sagrada.
4º - Que os membros das Lojas sejam exclusivamente homens.
5º - Que a Potência tenha jurisdição soberana sobre os Graus Simbólicos nas as Lojas sob seu controle e não divida essa autoridade com um Conselho Supremo ou outro Poder.
6º - Que o Volume da Lei sagrada, com o Esquadro e o Compasso sobrepostos sejam sempre exibidos quando a Potência ou suas Lojas estiverem em sessão.
7º - Que a discussão de religião e política dentro da Loja seja estritamente proibida.
8º - Que o segredo nos modos de reconhecimento, o simbolismo do terceiro Grau e os princípios dos antigos usos do Ofício sejam estritamente observados." Mas as dúvidas não param na questão dos Landmarks.
Nas Constituições de Anderson a observância das Antigas Obrigações é ainda mais controversa.
Por isso mesmo, aos recém iniciados é apresentado um resumo defeituoso, com uma dúzia de páginas, do texto integral de James Anderson (1679-1739) que tem 226 páginas em inglês antigo, (edi- ção original do ano 1723).
Os textos fundamentais dessas Antigas Obrigações (Landmarks e Constituições) são como os conteúdos da Bíblia que quase ninguém leu, mas que todos citam conforme o interesse pessoal ou os equívocos que queiram perpetuar.
Neste aspecto inda se reproduz o costume dos antigos párocos do interior brasileiro que desestimulavam a leitura na íntegra da Bíblia a fim de não suscitarem questionamentos nas cabecinhas dos fiéis. No entanto, as Constituições de Anderson estabelecem preceitos tão detalhados que os mais festivos maçons haveriam de se sentir constrangidos, caso sua observância fosse de fato exigida.
Por exemplo: Página 51: "As pessoas admitidas como Membros de uma Loja precisam ser Homens bons e leais, nascidos livres e de idade madura e discretos, não sendo servos, nem mulheres, nem homens imorais ou escandalosos.[...]
Toda promoção entre Maçons é baseada apenas em Valor real e Mérito pessoal a fim de que os Irmãos não sejam expostos à Vergonha, nem a Arte Real seja denegrida. (e mais adiante) "... não deveis reunir-vos em Comitês privados ou Conversações em separado sem permissão do Mestre, nem falar de coisa que seja indecorosa.
Nem interromper o Mestre, os Vigilantes nem qualquer Irmão; nem se comportar de forma ridícula, zombeteira enquanto a loja estiver ocupada no que é sério; nem usar de nenhuma linguagem indecorosa sob qualquer pretexto.
Página 54: "... diverti-vos com júbilo porém evitando todos os excessos ou evitando forçar qualquer irmão a comer ou beber além de sua inclinação ou impedindo-o de ir-se quando seus motivos o chamarem a isso." ‒ ‒ e por aí vai, como deveria ser em todos os tempos numa fraternidade que pretende formar líderes e servir de exemplo e referência para o mundo profano. Todavia, a questão de bem cumprir essas Constituições e os famigerados Landmarks ultrapassa imposições de ordem moral, uma vez que, sendo iniciado, o homem não tem mais o direito de ser "um ateu estúpido nem um libertino irreligioso" (palavras textuais de James Anderson: "a stupid atheist, not an irreligious libertine"). Esse preceito, longe de ser religioso, impõe que um maçom não seja "um estúpido libertino" ‒ ou seja: uma pessoa que proceda com irreverência para com as coisas sagradas ou para com a família; ou que leve uma vida dissoluta, entregando-se imoderadamente aos prazeres da carne. Entendam como melhor julgarem... Dito isso, passarei adiante e convido vocês a acompanharem a série de artigos que planejo divulgar com a análise das Constituições de Anderson e dos Landmarks sob o aspecto das regras administrativas, preceitos e leis fundamentais que devem reger os estatutos maçônicos, a vida das instituições, os regimento das Potências e os regulamentos das Lojas.
Todos sabem que as funções dos Oradores, Procuradores, Juízes, Deputados e Delegados na Maçonaria dependem de sólidos conhecimentos dessas matérias. É o que veremos nos próximos estudos.
(1) As Antigas Obrigações compreendem o Regius Manuscript, os 53 textos da Grand Lodge, os 21 chamados Sloane, os 9 textos do Tew, os 8 de Sundry, Spencer, Roberts e Berthelon com 6 textos cada e a menor das cole- ções, Cooke com 3 textos.
(2) Este princípio põe fim às pendengas e arengas intermináveis sobre regularidade em solo brasileiro.
Basta observarmos qual ou quais Potências foram fundadas por três ou mais Lojas regularmente constituídas e estarmos atentos à brutal diferença entre "regulardade" e "reconhecimento".
(3) É bom não confundir imortalidade da alma com reencarnação, pois (a título de exemplo) o catolicismo prega a imortalidade da alma e contesta a reencarnação.
(4) Foi a questão da jurisdição soberana sobre os Graus Simbólicos nas Lojas sem o compartilhamento da autoridade com um Conselho Supremo que motivou a crise de 1927 com a criação das Grandes Lojas por Mário Behring (ver meu livro "História, Fundamentos e Formação da Grande Loja Maçônica de Minas Gerais", páginas 94 a 111).
(5) A discussão sobre política dentro das Lojas é inevitável, uma vez que o homem é político por natureza, isto é ‒ ocupa-se de assuntos públicos pertinentes à cidadania e aos negócios do governo.
O que Anderson desaconselhou foi a promíscua convivência dos maçons com a politicalha dos interesses pessoais, trambiques eleitorais dentro e fora da Ordem, tapinhas no ombro e troca de favores, ainda tão comuns em nosso meio.
Quanto à religião, Anderson foi forçado a preservar o status dos reis ingleses que comem na mesma mesa com os poderosos da Igreja Anglicana. Ÿ Este artigo não representa a palavra oficial de nenhuma Potência, Loja ou Corpo Maçônico. Trata-se da opinião e pesquisa pessoal do autor, uma vez que "a Maçonaria não impõe nenhum limite à livre investigação da Verdade, e é para garantir essa liberdade, que ela propõe a todos a maior tolerância."
(*) O Irmão José Maurício Guimarães é Venerável Mestre e fundador da Loja Maçônica de Pesquisas “Quatuor CoronaƟ, Pedro Campos de Miranda”, jurisdicionada à Grande Loja Maçônica de Minas Gerais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário